domingo, 11 de janeiro de 2009

De porque bombardeios devem ser respondidos com sapatadas

“Desde os dias de João Batista até agora, o Reino dos Céus sofre violência, e violentos se apoderam dele.” (Mateus 11:12. Bíblia de Jerusalém)

Outro dia lí esse versículo... Não entendi nada... Desde então ando refletindo bastante sobre ele. Até porque, tirando a reforma ortográfica, 2009 só nos trouxe nas manchetes de jornais um bando de gente que acha que pode se apoderar do Reino dos Céus através de violência.

E é verdade não é? Até aquele momento na Palestina eternizado e cristalizado no tempo com o nome de “Mateus 11:12”, se fazia violência ao Reino dos Céus, e os violentos é que se apoderavam dele.

Me recordo do Rei Davi, que foi viver um tempo com os Filisteus, ludibriava eles, matava homens e mulheres. Me recordo do ataque kamikase de Sansão e de todas as guerras e tretas que o povo de Israel lutou desde o começo. Me recordo dos salmos em que o salmista clama por vingança. Me recordo até mesmo do livro Apócrifo de Judite (deuterocanônico dependendo do apito que você apita), na qual a heroína engana, seduz e decapita um grande general de uma nação ímpia.

Desde os tempos de João Batista (e acredito que João Batista esteja aqui representando “os profetas”, até porque no versículo 14 ele é identificado com Elias), violentos se apoderavam do Reino dos Céus. Será que Saramago estava certo quando disse que a Bíblia estava repleta de maus exemplos? E onde estão, então, os bons exemplos? Não é a luta pela liberdade um bom exemplo? Fazer guerra contra a opressão não é um bom exemplo?
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Lutar, ainda que seja por justiça, sempre implicou em luta. Guerrear, ainda que seja pelo Reino, sempre implicou em guerra. Rebelar-se, ainda que seja para atingir a liberdade, implica em forcas e guilhotinas.

Sabe, conheci uma menina Cristã que apoiava a luta armada como forma válida para acabar com o sistema opressor e maligno em que vivemos. Não a julgo, até porque, no pouco tempo em que conversamos ela me pareceu uma moça bem bacana, gente boa e uma Cristã de Fé (não é um nó cego cabeção como eu quem vai apontar o dedo). Além do que, a indignação dela é muito sadia para qualquer um que decide seguir a Cristo. Mas digo que discordo dela.

Brecht sabia (aposto que Davi também sabia), “o ódio contra a baixeza também endurece os rostos! A cólera contra a injustiça também faz a voz ficar rouca!”

O que essa gente toda não sabe (e o que muita criança Palestina vai morrer sem ter a chance de ficar sabendo), é que não é mais pra ser assim. Em algum lugar lá perto de Mateus 11:12 essa história muda! O Reino dos Céus não se concretiza na base da porrada! Matar mulheres e crianças palestinas não ajuda (dãh), se fazer de homem bomba por uma causa qualquer também não ajuda; até mesmo enforcar o último governante nas tripas do último sacerdote (que a principio pode parecer uma ótima ideia*), também não é a maneira de se proceder para se chegar ao Reino (ou se trazer o Reino).

Que fazer então?

Fugir do mundo como o diabo foge da Cruz e esperar que o Reino venha... afinal de contas ele virá mesmo?

Se resignar com tantos que de veias abertas e dentes cerrados, sofrem, com tanta coisa zuada, com tanta merda que acontece?

NÃO!

Desde os dias de João Batista até agora, o Reino dos Céus sofre violência, e mesmo enquanto escrevo, ainda os violentos tentam se apoderar dele. Altivos e donos da Verdade como se a Verdade fosse um conceito e não uma Pessoa, eles tentam estabelecer o reino na base da porrada. Mas o reino é o reino deles, não dEle, não o Reino da Verdade.

E como então lutar contra os violentos sem se tornar um violento? Como se irar com a injustiça sem que todos os músculos da face fiquem irremediavelmente endurecidos? Como bradar contra a opressão sem que a voz fique rouca? Como endurecer sem jamais perder a ternura?

“aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanço para vossas almas” (Mateus 11:28). Quem disse isso foi o camarada que veio colocar pai contra filho, que veio trazer espada e não paz à terra; e, de forma paradoxal, é chamado de Príncipe da Paz, e nos deu Paz, de forma abundante. Ele nunca se resignou! Ficou bastante nervoso com as falcatruas que rolavam naquele tempo, foi sarcástico com os discípulos que não sacavam, tirava com a cara dos fariseus. Ele uniu zelotas e publicanos sob uma mesma Esperança, um mesmo Reino! Temos mesmo que aprender com Ele: humilde de coração e manso. E ao mesmo tempo nunca se resignou, NUNCA deixou de se indignar com a injustiça, NUNCA hesitou em expulsar aos pontapés os vendedores do templo.

O negócio é que muita coisa mudou, não sei precisar quando foi exatamente, mas sem dúvida que foi por volta de Mateus 11:12, o Reino de Deus passou a ser propriedade dos pobres de espírito, humildes e mansos. E o visto dos violentos expirou (será que esse pessoal de fato chegou a ter um “visto”...)

Queria ter escrito um texto bonito e tocante sobre as imagens de crianças palestinas mortas em ataques, mas, no duro, só consigo dizer que isso é mesmo uma merda. E a indignação que me move, não me move para a violência, mas para o amor, para a compaixão (e bem sei que talvez seja tempo de deixar de lado a mansidão e distribuir alguns bons pontapés), ainda assim, sinto que sem o amor, nada pode ser feito.

Me parece que indignação, sem amor, fé e esperança, é um negócio meio vazio (a mesma coisa parece acontecer com Rock’n’Roll e com sexo...).


Chego até aqui, não consigo ir além. Até por que minhas reflexões acabaram sendo sobre violência em geral e não sobre o caso específico ao qual temos assistido nestes últimos dias na Palestina.

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Paz de Cristo amiguinhos.
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E que também as tretas de Cristo sejam nossas...
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Amo vocês
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*Sim... idêia

Um comentário:

Marie Curie disse...

Olha, achei o seu blog! Bjus na K, e visite o nosso blog!

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Bjos emi!