sábado, 13 de junho de 2009

Mente, matéria, naturalismo e uma visão completa de mundo. Uma reflexão.

"Mais doloroso é o silêncio absoluto de todas as nossas investigações científicas para com nossas questões referentes ao significado e escopo de todo espetaculo. Quanto maior a atenção com que o observamos, mais despropositado e tolo nos parecera. O espetáculo em andamento obviamente adiquire um significado apenas com relação à mente que on contempla. Mas o que a ciência nos diz sobre esse relacionamento é patentemente absurdo: como se a mente só tivesse sido produzida por esse mesmo espetáculo a que está ora assistindo e que perecera com ele quando o Sol finalmente esfriar e a Terra tiver se transformado nem deserto de gelo e neve" (Erwin Schrödinger, Mente e Matéria).
Recomendo a leitura dos ensaios do ganhador do premio nobel do inicio do século. Em particular "O que é Vida?" é geralmente descrito como "seminal". Em "Mente e Matéria" Schrödinger diversas vezes acaba viajando na maionese, o que não deixa de ser interessante, muito embora eu não concorde com todas as viagens do homem.
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Acho ainda que esse ensaio da decada de 1950 pode dar algumas dicas de como abordar o dialogo entre fé e ciência. Em particular o paragrafo que transcrevi a cima.
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De fato, o problema está posto: o materialismo metodológico nos mostra, quanto mais o utilizamos como lupa para destrinchar o mundo a nossa volta, mais encontramos um mundo sem sentido ou próposito. A propria consciência, que nos permite 'assistir ao espetáculo' e dar lhe algum valor é, ela mesma, fruto do desenrolar do espetaculo e ira embora, junto com tudo mais, ao se fecharem as cortinas.
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Ainda não terminei de ler o livro, mas ao ler esse paragrafo, uma pausa para reflexão foi necessária. A patente (ou aparente) inimizade entre o pensamento racional analítico e o pensamento místico se escalonou ao longo do século XX (como mostra a obra de Bertrand Russel: "Science and Religion"). E até o presente momento não foi resolvido! Ontem mesmo o caderno MAIS da Folha de São Paulo, numa matéria a respeito dos 400 anos da invenção do Telescópio por Galileu, que a "Igreja ainda está tentando entender a ciência".
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Longe de dar a afirmação um ar pessimista, acho isso ótimo! É ótimo que a fé Cristã reconheça que ainda não sabe direito entender a ciência e que busque o entendimento dessa que, na minha opinião, é uma baita benção de Deus! De fato, não sabemos onde traçar as fronteiras que "limitam" a ciência e deixam espaço para a nossa fé. Pior ainda! A ciência por vezes ignora todas as fronteiras e permeia, cada vez mais, todos os aspectos da nossa vida e respostas dos próprios cientistas nos parecem, no minimo insatisfatórias. E não vou entrar aqui nas opiniões dos auto-intitulados inimigos da fé a respeito do assunto, vou apenas transcrever mais um paragrafo de "Mente e Matéria", que segue ao que abriu esse post (a cima):

"Gostaria de mencionar rapidamente o notório ateismo da ciência que vem, é claro, sob o mesmo cabeçalho. A ciência está semrpe sendo criticada, mas tão injustamente. Nenhum deus pessoal pode fazer parte de um modelo de mundo que se tornou acessivel à custa de remover dele tudo o que é pessoal. Quando se tem a experiência da presença de Deus, sabemos que é um evento tão real quanto uma percepção imediata dos sentidos ou como a da própria personalidade. Como elas, Deus deve estár ausente na imagem do espaço-tempo. Não encontro Deus em nenhum lugar do espaço nem do tempo - é isso o que um naturalista honesto lhes dirá. Por isso, ele incorre na reprovação daqueles em cujo catecismo está escrito: 'Deus é espirito'. " (Erwin Schrödinger, Mente e Matéria).
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Esse afastamento completo de Deus da nossa imagem do mundo natural ofende aquele que tem fé. Parece contrastar e entrar em conflito com o Deus cujo Espirito desde o principio pairava sobre as águas, o Deus Criador de milagres e proezas que as Escrituras relatam. Ainda assim, acho que Schrödinger dá uma bola dentro. Penso ser muita pretensão achar que o Deus que antes de tudo é Amor -um Deus que é Espirito- vá ser revelado a nós por nossos próprios esforços em desvendar a natureza. A ciência permeia tudo e isso não deve ser temido. Antes, como eu já falei, é uma grande benção que possamos entender mais e mais a respeito do mundo que nos cerca! Não precisamos mais de idolos para fazer proliferar nossas colheitas ou nos livrar de pestes e doenças.
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Ao mesmo tempo temos de nos perguntar até que ponto essa 'lavagem' de tudo pela impessoalidade cientifica nos leva de fato para a verdade. Ao livrar o mundo de seus demônios a ciência também livra o mundo de seus anjos, nos exuma de milagres tanto quanto de maldições e destrói as 'impurezas' de nossos próprios sentimentos da interpretação do mundo ('aquela coincidencia que aconteceu naquela manhã em que sua vida mudou foi SÓ uma coincidência e NÃO um sinal do Divino').
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Aparentemente crentes e descrentes se degladiam com isso à uns 400 anos e não sou eu quem vai esgotar o assunto. Mas gostaria sim de argumentar que, embora seja uma benção, a ciência não é completa nem nos da uma visão completa do mundo! O fato de, ao nos debruçarmos sobre a imagem cientifica de mundo, a coisa toda nos parecer despropositada e sem sentido não significa que não exista um sentido. Antes, significa que a ciência tem limitações. Não as fronteiras que alguns, desesperadamente, tentam impor a ela artificialmente, mas antes, fronteiras que ela mesmo traça. De fato, creio em um mundo guardado por anjos e assombrado por demônios onde as coincidências podem ser muito mais do que coincidências. Onde, as vezes, aquela conversa no busão que mudou teu jeito de ver as coisas foi mais que só uma daquelas conversas de busão. Minha pequena me disse ontem a noite que, em alemão, eles tem só uma palavra para fé e esperança[1]. Vivo com esperança e creio que isso peça, necessariamente por fé.
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Quem leu o texto do Alvin Platinga cujo link eu já passei, pode ver uma dessas fronteiras da impessoalidade científica. Schrödinger nos fez atentar para o absurdo de ter uma mente que é um fruto cego do próprio desenrolar do universo que ela própria é capaz de contemplar. Platinga nos faz nos perguntarmos porque deveriamos confiar SOMENTE nessa imagem mental que temos de mundo quando esta foi moldada pelos mais 'primitivos' impulsos: comer, fugir, lutar e acasalar. Para Platinga, quem possui fé em um próposito e sentido maior, apoia sobre a fé a crença de que a própria visão de mundo reflete, de alguma forma, a realidade das coisas. Mas para ele, o naturalismo cientificista dá um tiro no pé ao depender para obtenção do conhecimento apenas da ciência. A mesma ciência que nos aponta que nossa mente é fruto de um processo cego que visa apenas a própria permanência.
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Eu já disse: a primeira vez que lí o argumento franzi o cenho com cara de cético pensando: "baita argumento meia boca!". Mas depois me coloquei a refletir no que encontramos no mundo natural. Quanto nosso comportamento e visão de mundo dependem de nossos instintos e quanto deles são herdaveis e portantos sujeitos a forças evolutivas? Não sei dar a resposta para essas perguntas, mas penso que tal resposta seja suficiente para nos fazer duvidar da própria imagem de mundo que construimos em nossas mentes, mesmo a impessoalidade cientifica. O ácido da evolução talvez tenha corroido o próprio recipiente de filosofia naturalista no qual ele foi colocado por alguns. E aí, de duas uma: ou o ácido não é tão ácido assim, ou talvez ele precise de um novo recipiente.
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O "notório ateísmo da ciência" é, na minha opinião, uma limitação de um modelo no qual o Amor e o Deus que é Espirito não figuram. Particularmente ainda me incomodo ao ver ele permeando tudo, mas cada vez mais entendo que uma visão de mundo completa vá muito além disso.
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Quando nossa escolha é entre apreciar o jardim como um imbrincado amontoado de atomos de carbono, hidrôgenio e oxigênio frio e distante. E aprecia-lo de forma pessoal sentindo o calor do sol e o cheiro das flores, achando aquilo tudo belo ou bucólico, frio ou triste. Penso que a segunda forma é bem mais satisfatória, mesmo que a primeira possa nos trazer insights preciosos que não devem ser descartados. Penso também que da segunda forma sempre havera espaço para as tais fadas[2] e que isso é bom
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é isso aí amiguinh@s

Amo vocês

Fiquem na Paz de Cristo



[1] Hoffnung seria esta palavra. A palavra Glauben não seria a tradução literal de "fé", mas antes de "crença" ou "acreditar". Tenho que conferir isso em um dicionário.

[2] refêrencia a frase de Douglas Adams: "Não basta apreciar a beleza de um jardim, sem ter que imaginar que há fadas nele?"... Mas vocês já sabiam disso, certo?

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